Sinto que a palavra me devora, toda vez que olho essa mesma folha estranha, tão velha conhecida, nem me pertence e nem a ninguém. Letra a letra cada uma em seu lugar, desencaixadas, reorganizadas.
Qual o peso de cada uma delas, o som leve, o som grave... De onde nascem as palavras? Todas elas. A palavra escolhe ser dita, resisto, é preciso ter cuidado para não espalhá-las demais ao vento, cuidado, elas são camaleões e nem sempre fazem sentido.
É nos descuidos que elas me tomam de um gole só ou em pequenas doses, mas não sem o devido zelo, elas cortam, rasgam com suas cores desconcertantes. Sinta cada uma na carne, imagine o trabalho árduo de um músico na composição de uma melodia, na violência dos sons que quebram os silêncios, na harmonia, pense também no processo consciente da escrita, da fala. Por mais consciência que se tenha, ainda assim, haverá uma força intuitiva em cada ato de fala, um ânimo passional. As palavras estão em nosso corpo, fluindo a todo tempo, e antes de nós esteve em outros e outros. Me sinto fragmentada e reconheço em cada palavra as marcas de uma continuidade que me constrói, feitos de carne, de sangue de pele e palavras, de outros, de muitos, de mim.
Luana
Luana